Dia dos (caros) namorados
 



Cronicas

Dia dos (caros) namorados

Eduarda Bittencourt


Hoje em dia, o doze de junho não passa de um dia normal para mim, quase que nem lembro. Gosto de me reunir ao coro que o proclama mais uma data capitalista de puro consumo. Mas nem sempre foi assim.

Quando era adolescente idealizava este dia. Se estivesse sozinha, esperava magicamente que meu príncipe encantado, ou o príncipe da vez, batesse a minha porta. Ele poderia ser um ex-namorado, um garoto do colégio ou um artista famoso da época. Algumas vezes foi o Andy Garcia. Isso no tempo do terceiro “O poderoso chefão”.

Já adulta. Houve anos que programei atividades etílicas com as minhas amigas solteiras. Em outros anos, estava acompanhada de um namorado, que não era nenhum príncipe. Diga-se de passagem, para comprovar minha teoria: restaurante caro e lotado, preço alto dos presentes e companhia sem graça.

Há dois anos tentei a versão moderna de arranjar um encontro para esta data. Esqueci a ideia de esperar bater a minha porta, deixei de lado o Andy Garcia jovem e parti para os aplicativos de relacionamento. Escolhi uma foto, selecionei meus objetivos e abri o catálogo. “Não, não, sim, não”. Dedo para esquerda, dedo para direita. “Foto bonita”. “Ué, sem foto? Assim não dá”. Foto do rosto. Barba, barba. “Como são iguais!”. “Match”.

— Oi.

— Oi, tudo bem?

— Tudo bem e você?

— Tudo ótimo.

— Fala de onde?

— De São Paulo, Perdizes. E você?

— De Pinheiros.


— Legal.

— Legal, pertinho.

— Faz o quê?

— Sou médica. E você?

— Analista de sistemas. Me manda uma foto sua?

Desfaço o “match”, há várias fotos minhas no perfil, canso da conversa sem sentido. Entro em outro dia, no outro, no outro e mais outro. Barba, barba. “Já não vi este ontem?”. Nas gôndolas do aplicativo parece que nunca saio da mesma sessão. Estou sempre dando voltas com meu carrinho, coloco e tiro a mesma caixa dezenas de vezes. Tento mudar de corredor, mas são todos iguais. Desisto.

Afinal, o dia dos namorados se resume a um evento de consumo: restaurantes mais cheios e caros que o habitual, flores e chocolates inflacionados, com a novidade dos aplicativos de relacionamento que mais parecem sessões de lojas de departamento. No final do dia, pego minha pipoca, assisto ao terceiro “O poderoso chefão” e fico à espera do Andy Garcia.


Eduarda Bittencourt é médica formada pela Universidade Federal do Paraná (UFPR). Goiana radicada em São Paulo desde 2010, é leitora de crônicas, contos, novelas de suspense e apaixonada por ficção histórica. Apesar de escrever desde a infância, ingressou no curso de escrita criativa da Metamorfose em 2022, a fim de escrever textos para que pessoas (além de si própria) leiam.

 

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